Chegou hoje ao fim o Fórum Económico Mundial de 2023 no qual, ao longo desta semana, estiveram reunidos os grandes decisores de elite mundiais da economia, da política e da diplomacia. Apesar do tema central ter sido “Cooperação num mundo fragmentado”, a edição deste ano fica marcada pelos assuntos que dominam a atualidade: Inflação e Guerra na Ucrânia; com destaque para os discursos de Christine Lagarde, Presidente do Banco Central Europeu (BCE), e de Volodymyr Zelensky, presidente da Ucrânia.
A estância de ski suíça de luxo de Davos foi a base para a discussão dos temas que estão a marcar a atualidade e para tentar definir a agenda para este ano, contando com uma assistência recorde, com 52 chefes de Estado e de Governo.
O evento internacional que decorreu entre 16 a 20 de Janeiro, reuniu cerca de 2.700 chefes de Estado e de Governo do mundo, CEO de empresas, representantes da sociedade civil e líderes juvenis provenientes da África, Ásia, Europa, Médio Oriente, América Latina e América do Norte com o objetivo de trabalharem para reconstruir a confiança e moldar os princípios, as políticas e as parcerias necessárias para enfrentar os desafios de 2023.
No entanto, as atenções da edição deste ano do Fórum Económico Mundial estiveram centradas em dois discursos que, paralelamente, centram todas as atenções face atual ao contexto económico, político e social.
“Vamos manter a trajetória atual de aumento de juros”
O alerta não podia ser mais taxativo. Christine Lagarde, Presidente do Banco Central Europeu (BCE), anunciou ao mundo que a instituição que lidera irá manter a trajetória atual de aumentos das taxas de juros, uma vez que a inflação da Zona Euro permanece “muito elevada”. “A nossa determinação no banco central é que volte ao objetivo de 2% de forma atempada” tomando “todas as medidas para o conseguir”, disse Lagarde.
Neste sentido, a presidente do BCE não acompanha a onda atual de que a Zona Euro não vai ter nenhuma recessão em 2023 e considerou urgente concluir o mercado único de capitais para poder financiar com capitais privados a transição digital e climática.
“A batalha contra a inflação não pode parar, mesmo que o aumento dos preços pareça já ter atingido o pico. Temos também de manter o rumo de resiliência que observámos em 2022. Manter o rumo é o meu mantra em termos de política monetária. Espero que a política fiscal não funcione em contraciclo à política monetária em 2023. Não precisamos de ser empurrados a fazer mais do que o necessário”, reforçou Lagarde.
Num painel do Fórum Económico Mundial, Lagarde salientou ainda que o contexto económico ficou “bem mais positivo” nas últimas semanas e que o PIB da Zona Euro poderá sofrer apenas uma “pequena contração”, e comentou ainda que o mercado de trabalho na Europa nunca esteve tão vibrante como agora e previu que 2023 será melhor do que o esperado.
O Conselho do BCE decidiu em dezembro subir as taxas de juro em 50 pontos base, um abrandamento em relação às duas subidas anteriores, que foram de 75 pontos base, mas ficou o compromisso de as aumentar mais significativamente a um ritmo sustentado. Esta semana circularam rumores de que o BCE decidirá outra subida das taxas de juro em fevereiro, mas que em março o aumento seria menor.
“A tirania avança mais rápido que as democracias”
Foi desta forma que o presidente Volodimir Zelensky pediu no fórum de Davos uma maior “celeridade” na tomada de decisões sobre a ajuda à Ucrânia, coincidindo com a renitência da Alemanha em autorizar a entrega de veículos de combate Leopard ao país.
“O tempo que o mundo livre usa para pensar é usado pelo estado terrorista para matar”, disse Zelensky, antes de uma reunião de fornecedores de armas ocidentais à Ucrânia. “O mundo não deve hesitar. A mobilização do mundo deve superar a próxima mobilização militar do nosso inimigo comum”, acrescentou.
Volodimir Zelensky pressionou assim a Alemanha, criticando Berlim pela hesitação no envio de tanques Leopard 2 para a guerra contra a Rússia. Após o governo alemão ter condicionado o envio deste equipamento militar a uma contribuição semelhante por parte dos EUA, através da entrega de tanques Abrams, o presidente ucraniano respondeu em tom crítico, por videoconferência: “Há momentos em que não devemos hesitar, nem comparar”.
Pressionado sobre a cedência de tanques de combate à Ucrânia, o ministro alemão Boris Pistorius, que durante a tomada de posse prometeu manter o apoio a Kiev, acabou por responder indiretamente à intervenção de Zelensky no Fórum Económico Mundial: Os sistemas de armamento alemães até agora entregues à Ucrânia já deram provas do seu valor, como, por exemplo, os Howitzers, o Gepard, ou o sistema de defesa de última geração Iris. Juntamente com os nossos parceiros, vamos continuar a apoiar a Ucrânia na sua luta pela liberdade, independência territorial e soberania”.
“Estamos no olho de um furacão de categoria 5”
A presença portuguesa nos debates do Fórum Económico Mundial de 2023 ficou resumida aos nomes de Guterres, Centeno e Azevedo.
O secretário-geral da ONU, António Guterres, afirmou que “estamos a assistir ao olho de um furacão de categoria 5”, ao descrever uma crise económica global a curto prazo e perspectivas sombrias para o mundo.
Guterres citou a recessão, que muitos países estão a enfrentar, e a desaceleração global, destacando ainda o aprofundar das desigualdades e a crise do custo de vida. O secretário-geral citou as interrupções na cadeia de distribuição, a crise de energia, os preços crescentes, o aumento das taxas de juros e a inflação.
No caso do Governador do Banco de Portugal, o responsável demonstrou estar otimista quanto à evolução da economia europeia, apontando que o desempenho “tem sido surpreendente” e poderá trazer melhores resultados do que o esperado.
“A economia tem-nos surpreendido trimestre após trimestre”, afirmou Mário Centeno, salientando que é provável que o quarto trimestre tenha sido de crescimento positivo e “talvez também sejamos surpreendidos na primeira metade do ano”.
Já Cláudia Azevedo, CEO da Sonae, alertou para as alterações no mercado laboral, decorrentes dos novos modelos de trabalho e das prioridades das várias gerações no pós-pandemia, que transformaram a atração e retenção de talento a nível global.
“Existe uma forte diferença de desempenho quando uma pessoa está comprometida, ou não, com um trabalho. Os valores têm de existir e ser autênticos. É algo que as pessoas valorizam no nosso caso”, realçou a CEO da Sonae. “Quando existiram os confinamentos [devido à Covid-19], foi muito fácil decidir que não íamos colocar ninguém em layoff. Os valores que nos guiaram nos últimos 50 anos vão continuar lá nos próximos 50”, acrescentou a responsável.