Em Dia Internacional das Mulheres, celebrado a 8 de março, o MoneyLab faz um retrato da relação entre mulheres e finanças pessoais, a partir de vários estudos existentes. Que diferenças de género existem em termos de salário? Qual o nível de conhecimento financeiro das mulheres? Em que gastam os seus rendimentos? E como encaram o mundo dos investimentos?
A relação atual entre mulheres e finanças pessoais é de dupla vulnerabilidade. Por um lado, continua a discrepância de rendimentos médios entre homens e mulheres, com a balança a desfavor do lado feminino, tanto na média europeia, como em Portugal. Por outro lado, há um maior desconhecimento feminino sobre temas financeiros, sobretudo investimento, que caminha a par de uma menor autoconfiança.
Comecemos pelo fosso salarial. Em termos médios mundiais, por cada dólar recebido por um homem, uma mulher ganha apenas 77 cêntimos, de acordo com dados da UN Women.
Na União Europeia (UE), os vencimentos brutos das mulheres são, em média, 12,7% abaixo dos vencimentos dos homens. Quando o foco é apontado exclusivamente à Zona Euro, o fosso aumenta ligeiramente: 13,6%. A média europeia “esconde” discrepâncias entre Estados-Membros: da diferença de 21,3% na Estónia até aos -0,7% do Luxemburgo. Estes são dados do Eurostat referentes a 2022.
A informação europeia está em linha com dados nacionais. De acordo com contas ECO com base em informação do INE, a fevereiro de 2024, existe discrepância de 179 euros no salário médio líquido de homens e mulheres, em 2023. O vencimento médio líquido das mulheres portuguesas é de 955 euros, enquanto o dos homens é de 1.134 euros.
Há ainda outras variáveis a ter em conta, como o impacto da maternidade nos rendimentos. As mulheres europeias podem perder até cerca de 29% dos seus rendimentos após serem mães, enquanto os homens podem ganhar mais 15% e progridem na carreira. Em Portugal, o impacto é diferente: as mulheres têm tendência a manter o seu ordenado após serem mães, enquanto os homens o aumentam em 15%. Estes são algumas das primeiras conclusões, divulgadas em fevereiro de 2024, do projeto MERIT – MothER Income InequaliTy – iniciativa do Instituto de Saúde Pública da Universidade do Porto (ISPUP) em parceria com o Centro de Investigação em Pandemias e Sociedade da Noruega.
De realçar ainda que, segundo o inquérito “Women & Wealth – Literacia Financeira no Feminino”, da Portuguese Women in Tech e Natixis, de 2023, mais de metade das mulheres portuguesas considera o seu salário injusto, mas não o negociou. O motivo? Mais de um terço não considerou ter segurança suficiente para o fazer.
Despesas e poupança
Onde são gastos os rendimentos das mulheres? Um estudo da Mastercard de 2023, “Mulheres e Finanças”, concluiu que a maior parte do rendimento (83%) das mulheres portuguesas é usado para habitação, alimentação e combustível. Segue-se, a uma grande distância, despesas com experiências, como jantar fora ou viajar (6%) e depois compra de roupa (3%).
O mesmo estudo refere que, para 63% das mulheres, o dinheiro é sinónimo de maior liberdade, desde já porque lhes permite concretizar objetivos e metas (32%) e diminui a ansiedade financeira perante dívidas e investimentos (27%). Ainda assim, esta liberdade pode ser difícil de alcançar: 7% das mulheres portuguesas não têm qualquer rendimento mensal, de acordo com o inquérito da Mastercard.
Do lado das poupanças, as metas de médio e longo prazo aparentam ser difíceis de concretizar. Duas em cada três mulheres portuguesas (65%) têm poupanças e/ou investimentos, mas cerca de metade (58%) precisa de usar estes montantes para pagar despesas correntes, refere o estudo de 2023.
A mesma fonte indica que cerca de um terço das mulheres em Portugal (35%) não consegue poupar. Os resultados de uma segunda edição do estudo “Mulheres e Finanças”, divulgado a 5 de março de 2024, comprovam que se mantém inalterada essa percentagem de portuguesas com “chapa ganha, chapa gasta” todos os meses. Além disso, 48% das mulheres verificam o saldo todos os dias.
Literacia financeira: o papel da autoconfiança
Quando se avalia o conhecimento financeiro de homens e mulheres, há um denominador comum: por norma, são estas últimas que apresentam níveis menores de literacia financeira. Um estudo do grupo de reflexão Bruegel, apresentado em fevereiro de 2024, reforça esta tendência encontrada em várias investigações e inquéritos, a propósito do mais recente Eurobarómetro de literacia financeira. Neste inquérito da União Europeia, os homens sabem responder corretamente a mais perguntas financeiras do que as mulheres (numa diferença de +18%).
Ainda assim, algumas destas diferenças entre géneros podem ser devidas não só a conhecimento, como também a autoconfiança. Isto porque, e segundo reforça a análise da Bruegel, as mulheres têm maior tendência de responder “não sei” a questões de conhecimento financeiro. Quando se remove a opção “não sei” de um inquérito, o fosso de conhecimento entre homens e mulheres diminui.
A falta de conhecimento tem impacto também na forma como as mulheres olham para os investimentos. Um estudo do BNY Mellon de 2022 refere que apenas uma em cada 10 mulheres norte-americanas sente que compreende os investimentos inteiramente e menos de um terço (28%) mostram-se confiantes em investir algum do seu dinheiro.
A mesma fonte indica que apenas 9% das mulheres consideram ter níveis elevados ou muito elevados de tolerância ao risco. E, em termos de instrumentos financeiros, 45% referem que investir dinheiro em ações – seja diretamente ou através de um fundo – é demasiado arriscado para si.
Evoluir a relação das mulheres e finanças pessoais
Uma grande parte das portuguesas (84%) tem como objetivo prioritário de vida a independência financeira, uma percentagem acima da média europeia, diz o estudo da Mastercard, de 2023.
Na comparação entre géneros, mais de metade (62%) acredita ter uma independência financeira menor do que os homens, devido a motivos como o trabalho extra não remunerado como cuidadoras de crianças e idosos (49%) ou a decisão de ser mãe a tempo inteiro (30%).
Ainda assim, sete em cada 10 mulheres consideram ter mais independência nas suas finanças do que as mulheres de gerações anteriores, na respetiva família, indica o estudo.
A edição de 2024 do “Mulheres e Finanças” reforça que existe uma forte vontade de mudança para uma melhor vida financeira. Em Portugal, 71% das mulheres procuram mais informação e orientação para gerir melhor as suas finanças. Em paralelo, mais de metade das portuguesas considera que a capacitação financeira aumenta, de forma significativa, a sua autoconfiança.