Quais os acontecimentos que marcaram o ano, com impacto nas finanças pessoais? Das elevadas taxas de juro às mudanças em instrumentos financeiros, recorde o que se passou neste 2023 em retrospetiva.
Na esteira de 2022, a inflação e as elevadas taxas de juro continuaram a marcar 2023. A política restritiva do Banco Central Europeu (BCE) de aumentos consecutivos das taxas – só pausada em outubro de 2023 – precipitou uma escalada nas prestações do crédito à habitação e a pressão sobre as famílias.
O contexto levou a medidas extraordinárias de alívio da prestação do crédito à habitação e à manutenção das exceções no resgate de Planos Poupança Reforma (PPR), iniciativas que se prolongam para 2024.
A fechar o ano, o MoneyLab reúne alguns dos principais acontecimentos que marcaram a economia e as finanças em 2023.
A escalada das taxas de juro
As taxas de juro foram o tema quente da economia europeia, ao longo de 2023. No ano anterior (julho 2022), o BCE aumentou pela primeira vez em mais de uma década as taxas de juro diretoras da Zona Euro. Este foi só o início de uma escalada das taxas que marcou 2023 e que teve impacto direto negativo nas carteiras das famílias com crédito à habitação – mas que, pela positiva, viu também um aumento progressivo (ainda que demorado) das taxas nos depósitos a prazo.
Foram 10 as subidas consecutivas das taxas diretoras, a última das quais em setembro de 2023. Em outubro, o ciclo de subidas chegou ao fim, com Christine Lagarde, presidente do BCE, a anunciar que o Conselho de Governadores do BCE tinha optado pela manutenção das taxas – uma decisão que se conservou nos restantes meses do trimestre.
Desta forma, 2023 encerra com a taxa das operações principais de refinanciamento da Zona Euro em 4,50%, a taxa da facilidade permanente de depósito em 4,00% e a taxa de facilidade permanente de cedência de liquidez em 4,75%.
A utilização das taxas em níveis restritivos tem sido estratégia do BCE como forma de combater a elevada inflação. A Reserva Federal (FED) norte-americana tem seguido uma estratégia semelhante. Ao todo, no atual ciclo económico, a FED subiu as taxas de juro 11 vezes e está agora numa fase de manutenção (em dezembro, o organismo anunciou a terceira decisão consecutiva de manter as taxas).
A inflação
A forte e acelerada subida de preços sentida em 2022 esmagou o orçamento das famílias, a nível global. Em Portugal, a taxa de inflação média anual fixou-se em 7,8% em 2022, o valor mais elevado em 30 anos. Mas o que aconteceu em 2023?
Em janeiro de 2023, a taxa de inflação homóloga estava em 8,6%, o que já denotava um abrandamento em relação a dezembro de 2022 (9,8%). Ao longo de 2023, a tendência foi de descida, com um revés pontual no verão.
Olhando para os dados mais recentes, novembro volta a confirmar a tendência. Portugal apresenta uma inflação de 2,2% (variação do índice harmonizado de preços), abaixo da média da Zona Euro (2,4%) e da União Europeia (3,1%). A meta definida pelo BCE para a inflação é de 2%.
Ainda assim, apesar da descida, os preços de bens e serviços, no dia a dia, continuam a pesar nas contas da população.
A comparação semanal do cabaz alimentar feita pela DECO Proteste mostra que, em 2023, o preço do cabaz subiu de 219,40 euros na primeira semana do ano para 231,15 euros (a 20 de dezembro). Pelo meio, houve altos e baixos: depois de uma tendência de subida no primeiro trimestre, o preço do cabaz alimentar desceu progressivamente a partir de abril. A tendência inverteu-se em meados de setembro – com novo ciclo de subidas.
A prestação da casa
À boleia da subida das taxas diretoras do BCE, as Euribor (indexante usado como referência para o cálculo das prestações de crédito à taxa variável) começaram em forte subida já desde 2022. Dependendo da Euribor de referência (a 3, 6 ou 12 meses), muitas famílias só sentiram o verdadeiro embate da subida nas prestações já este ano.
Os últimos dados do Instituto Nacional de Estatística (INE), referentes a novembro, mostram que 61% da prestação média do crédito à habitação correspondeu ao pagamento de juros. No total, a prestação média em novembro foi de 396 euros, mais 108 euros do que em novembro de 2022.
A decisão de pausa na subida dos juros do BCE fez-se sentir, entretanto, nas Euribor, com descidas na média mensal de novembro do indexante a 6 e 12 meses. Ainda assim, um alívio real nas prestações da casa só está previsto para 2024, caso a expetativa de redução gradual das Euribor se confirme.
A pressão nas prestações gerou diversas medidas de alívio para as famílias.
Foram reforçadas as medidas de bonificação temporária dos juros e a isenção de comissões nas amortizações parciais ou totais no crédito à habitação, assim como introduzido um novo mecanismo de redução dos juros por dois anos para 70%.
Já as regras de resgate de PPR para amortização do crédito à habitação, pagamento de prestações ou outros fins, sem penalizações, introduzidas em 2022, mantiveram-se em 2023 – e vão continuar em 2024, com um novo teto máximo para amortizações.
Uma nova série nos certificados de aforro (e depósitos a prazo com ofertas mais atrativas)
Depois de uma corrida dos portugueses aos Certificados de Aforro, o Governo suspendeu a série E a 2 de junho de 2023, uma decisão também decorrente da subida das taxas de juro. Uma nova série, F, começou a ser comercializada a partir de 5 de junho, com uma taxa máxima de 2,5% (face aos 3,5% da anterior).
Já a oferta de depósitos a prazo cresceu progressivamente em remunerações, ao longo do ano, com diversas opções no mercado de rentabilidade igual ou maior do que a oferecida pelos certificados de aforro.
Queda do governo
O primeiro-ministro português, António Costa, anunciou a 7 de novembro a sua demissão, no rescaldo de uma investigação do Supremo Tribunal de Justiça. A incerteza política teve consequências imediatas na Bolsa de Lisboa, embora de pouca dura. Depois de uma queda abrupta nas cotadas do PSI, o mercado normalizou rapidamente.
A dissolução do Parlamento foi adiada pelo presidente da República para permitir a aprovação do Orçamento do Estado para 2024, garantida no hemiciclo a 29 de novembro. Já as eleições legislativas estão marcadas para 10 de março de 2024.
Mercados bolsistas
Apesar do ano difícil para muitas famílias, com a pressão dupla da inflação e dos juros, há dados positivos vindos da bolsa, a fechar 2023.
O PSI subiu 11,56% num ano, com uma cotação a 22 de dezembro de 2023 nos 6422,27 pontos. Por cotadas, a Mota-Engil foi a que mais valorizou a um ano, com uma subida de 228,49%, seguida do banco BCP (89,99%) e Ibersol (19,49%).
Já o índice europeu Euro Stoxx 50 valorizou 17,97% em um ano, com uma cotação de fecho a 22 de dezembro nos 4521,47 pontos. Por país, o IBEX 35 de Madrid obteve uma valorização a um ano de 22,27% (10111,90 pontos, a 22 de dezembro), o DAX de Frankfurt valorizou 19,37% (16706,18 pontos a 22 de dezembro) e o CAC 40 de Paris 15,54% (7568,82 pontos, a 22 de dezembro).
O S&P 500 obteve uma valorização de 24,17% em um ano. A 22 de dezembro, o índice norte-americano fechou nos 4754,63 pontos.
Os dados dos mercados bolsistas apresentados são referentes ao período de análise a um ano, consultados a 25 de dezembro de 2023.