A Reserva Federal dos Estados Unidos (Fed) optou por manter as taxas de juro no intervalo atual de 4,25% – 4,50%. A decisão, anunciada hoje, já era esperada pelos analistas, mas acompanhada de algum pessimismo em relação à economia do bloco norte-americano.
Em comunicado, a Fed indica que “a incerteza em torno das perspetivas económicas aumentou”. Ainda assim, a decisão de hoje teve em conta uma expansão da atividade económica “a um ritmo sólido”, a estabilização da taxa de desemprego num nível baixo “nos últimos meses”, condições do mercado de trabalho sólidas e a inflação em níveis ligeiramente elevados.
Desde o início de 2025 que a Fed tem preferido manter inalteradas as taxas de juro diretoras. Isto depois de, no segundo semestre de 2024, terem sido feitos diversos cortes (total de 100 pontos base).
A Fed reafirmou a intenção de, ao longo de 2025, avançar com dois cortes nas taxas de juro.
Novas projeções económicas
Também hoje, a Fed apresentou projeções revistas em termos de inflação e crescimento económico, já num contexto de maior incerteza económica no bloco norte-americano.
As projeções de crescimento da economia dos Estados Unidos foram revistas em baixa, de 2,1% para 1,7%. Quanto à taxa de desemprego, as previsões foram também ajustadas de 4,3% para 4,4%.
Já os dados da inflação indicam que, no final do ano, esta deva atingir 2,7%, e não 2,5%, como anteriormente previsto (segundo o indicador PCE – Personal Consumption Expenditures).
Não obstante, fevereiro marcou um abrandamento da inflação nos Estados Unidos, após quatro meses consecutivos de subida. A taxa desacelerou de 3% para 2,8%, de acordo com o IPC – Índice de Preços no Consumidor. Do lado da Zona Euro, fevereiro foi também mês de alívio na inflação, de 2,5% para 2,3%.
A evolução da inflação é um dos indicadores de base para as decisões dos Bancos Centrais. Por norma, taxas de juro mais restritivas são usadas para tentar controlar uma inflação acelerada (daí o ciclo de subidas em 2022-23). À medida que a inflação abranda, há mais margem para possíveis cortes nas taxas.
Nos Estados Unidos, o sentimento de mercado está muito diferente do que marcou o arranque do ano.
A incerteza em relação às tarifas aduaneiras anunciadas por Donald Trump e à retaliação tarifária de outros blocos, as quedas nas bolsas (no último mês, o S&P 500 caiu cerca de 8% e Nasdaq cerca de 11%), a inflação persistente e o arrefecimento económico (e alguns medos de uma possível recessão, que são afastados pela Fed) têm amontoado preocupações. Caso o impacto real na economia se venha a agravar, poderá haver maior pressão para alívio nas taxas de juro, como forma de estimular a economia.
Impactos além dos Estados Unidos
As decisões da Fed em matéria de taxas de juro têm impacto direto na economia norte-americana. No entanto, produzem também efeitos indiretos nos consumidores e investidores do resto do mundo.
Damos-lhe alguns exemplos. Uma descida dos juros nos Estados Unidos beneficia o mercado acionista norte-americano e incentiva o investimento em ativos de risco, mas também torna as obrigações menos interessantes. Para investidores portugueses com ativos nos EUA, estas dinâmicas têm impacto no portfólio.
Além disso, uma descida dos juros pode também enfraquecer o dólar, prejudicando a rentabilidade dos ativos em dólares.
Por outro lado, um enfraquecimento do dólar pode tonar mais baratas as matérias-primas negociadas nesta moeda (como o petróleo), o que indiretamente contribui para um alívio da inflação noutros blocos, como na Europa.
No “jogo” de descidas e subidas, Europa e EUA enfrentam pressões mútuas. Com a Fed a manter as taxas inalteradas, o BCE tem maior pressão para manter também as taxas de juro europeias, e assim evitar o enfraquecimento do Euro. Se a Fed começar um novo ciclo de cortes, o BCE ganha mais margem para prosseguir o caminho atual de reduções consecutivas, sem impacto excessivo no Euro.
Fed e BCE decidem da mesma forma?
Cabe à Fed e ao Banco Central Europeu (BCE) decidir a evolução das taxas de juro diretoras, nos respetivos blocos económicos dos EUA e Zona Euro.
Para definir se as taxas sobem, descem ou mantêm-se, os Bancos Centrais olham para fatores semelhantes: inflação, mercado de trabalho, crescimento económico e condições de crédito.
Há, no entanto, diferenças. Enquanto o BCE tem um objetivo principal único (estabilidade dos preços), a Fed rege-se por dois objetivos principais (estabilidade dos preços e pleno emprego). Isso significa que a Fed tende a dar mais importância aos indicadores do mercado de trabalho do que o BCE.
Por outro lado, o BCE tem de ter em conta os impactos das suas decisões na dívida pública de diferentes países da Zona Euro. Já a Fed tem de gerir apenas uma economia.