Há uma confiança muito elevada nos jovens portugueses quando o tema é a gestão do seu próprio dinheiro, no topo da média da OCDE. No entanto, esta alta confiança é partilhada por aqueles que, na prática, têm piores níveis de literacia financeira. A avaliação da OCDE dá conta de que a literacia financeira entre os jovens de Portugal piorou em quatro anos.
Entre a perceção e a realidade pode existir uma grande diferença. E esse é um dos “ensinamentos” a tirar do mais recente relatório do Programa Internacional de Avaliação de Alunos (PISA) da OCDE – Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico, divulgado hoje e referente a 2022.
Entre os vários países avaliados, é em Portugal que os jovens apresentam maior confiança na sua capacidade de gerir o dinheiro (86%) – mesmo aqueles que tiveram pior desempenho em literacia financeira. 74% dos jovens com pior desempenho consideram gerir bem o dinheiro, comparado com 64% da média da OCDE.
De notar ainda que, em termos de conhecimento, Portugal apresentou uma “diminuição significativa” no desempenho dos jovens em literacia financeira desde o relatório de 2018 (-14 pontos), assim como a Polónia (-11).
O relatório PISA analisa o conhecimento de alunos de 15 anos em temas relacionados com dinheiro, em 20 países. Os resultados sublinham a importância da literacia financeira em contexto escolar, sobretudo para estudantes em contextos económicos mais desfavoráveis.
Em média, 18% dos estudantes dos países avaliados não atingem um nível básico de literacia financeira, sendo incapazes de aplicar o seu conhecimento em situações práticas que necessitem de decisões financeiras.
Os jovens portugueses tiveram uma pontuação média de 494 pontos em termos de literacia financeira, ligeiramente abaixo da média da OCDE de 498 pontos. No topo do ranking está a comunidade flamenga da Bélgica (527 pontos) e a Dinamarca (521). No final da lista surgem a Arábia Saudita (412) e a Malásia (406).
O impacto da desigualdade na literacia financeira dos jovens
Os resultados demonstram que os níveis de literacia financeira podem ser afetados por disparidades económicas e género.
Na média da OCDE, há um fosso de 87 pontos entre os jovens de contextos socioeconómicos mais favorecidos (melhores resultados) e os de contextos menos favorecidos (piores resultados). Em Portugal, o intervalo é de 74 pontos. Ou seja, menor do que a média da OCDE, mas ainda assim a precisar de atenção em termos de políticas de literacia financeira que possam mitigar as desigualdades.
De notar ainda que, de forma geral, o rendimento per capita de um país pode ser associado positivamente ao desempenho médio em termos de literacia financeira. Mas há exceções, na comparação entre países. “Por exemplo, o desempenho médio na Hungria, Polónia e Portugal foi significativamente acima daquele dos Emirados Árabes Unidos, apesar do PIB per capita da Hungria, Polónia e Portugal ser significativamente mais baixo do que nos Emirados Árabes Unidos”, realça o relatório PISA.
Em termos de género, há mais rapazes no grupo de estudantes com pior literacia financeira e também no grupo de maior literacia, na média dos países avaliados. Em Portugal, os rapazes tiveram melhores resultados de literacia financeira do que as raparigas. O mesmo foi verificado na Áustria, Costa Rica, Dinamarca, Hungria e Itália. Já na Bulgária, Malásia, Noruega e Emirados Árabes Unidos os resultados foram inversos: as raparigas demonstraram maior conhecimento.
Maior conhecimento leva a melhores decisões
O relatório demonstra ainda a relação entre conhecimento e boas práticas financeiras. Os jovens com melhor desempenho em literacia financeira têm maior probabilidade (72%) de poupar dinheiro do que os de menor desempenho. Têm ainda maior probabilidade (50%) de comparar preços em diferentes lojas antes da compra.
Em termos de produtos e pagamentos, cerca de 60% dos estudantes avaliados – na média de todos os países – já têm uma conta bancária e/ou um cartão para pagamentos. Mais de 85% fizeram pelo menos uma compra online nos últimos 12 meses. E cerca de 66% destes jovens fizeram um pagamento através de telemóvel.
Recomendações aos governos
O relatório da OCDE oferece um conjunto de recomendações aos diversos países, de forma a aumentar a literacia financeira dos jovens em idade escolar, diminuindo desigualdades e promovendo o interesse sobre os temas relacionados com finanças pessoais. A saber:
- Promoção de oportunidades para aprofundar a literacia financeira nas escolas, acessíveis a todos os estudantes, independentemente do respetivo contexto socioeconómico;
- Mitigação das desigualdades socioeconómicas nas competências e comportamentos financeiros, promovendo a literacia financeira também fora do contexto escolar (incluindo para pais e pares);
- Medidas focadas na melhoria das atitudes dos estudantes, a par do conhecimento e competências, de forma a aumentar o interesse sobre finanças pessoais;
- Garantia de que as oportunidades de aprendizagem existentes através do acesso e uso de serviços financeiros são seguras e apropriadas à idade;
- Promoção de quadros de proteção ao consumidor em matéria financeira para proteger melhor os consumidores jovens.